sábado, 12 de junho de 2010

Bananas

As bananas dentro do cesto de bronze enferrujado zombam de mim. O amarelo constante delas insistem em ter a mesma paciência das putas que esperam os faróis alumiarem sua xota.
Quando escutam o barulho da porta de vidro da cozinha abrindo, as bananas estufam o peito e tiram a calcinhas do rego para me impressionar. Sempre conseguem.
Eu as vejo todos os dias no mesmo lugar. Em cima da mesa da área de serviços. Porém, nem todos os dias as observo porque sou ridículo.
Eu sou um homem ridículo. E sei disso, talvez, desde que nasci. E a medida que crescia esse fato se evidenciava pra mim em cada livro que lia, em cada escola que estudava, em cada riso construído que esboço em meu rosto oleoso, em cada boceta que comia.
Por isso odeio o sarcasmo das bananas. Tenho inveja delas. O amarelo maduro que portam só é interrompido quando estão pra morrer. Ai apodrecem, amolecem e ficam negras, e morrem. Zombando de mim.
A noite, normalmente, é que as observo com cuidado pois é a noite que penso no dia que tive e na rotina solitária que tenho nos dias. Me sinto, olhando-as nos cachos, todas juntas, mais sozinho que o sozinho de antes de dormir que sinto no meu quarto escuro.
Ser sozinho é ruim. Sei que estou sozinho até quando estou cercado de indivíduos que considero amigos. E como fico triste em ser sozinho! É triste pois conheço a verdade e ninguém mais a conhece. Ah, como é duro conhecer a verdade sozinho. Mas isso os indivíduos amigos não vão entender. Não, não vão entender jamais. Só as bananas entendem. MAs entendem mudas e zombam com pena da minha sapiência desgraçada.
Por isso as como. Mastigo cada pedaço de potássio delas só para matá-las e assim não mais zombarem de mim. Essas putas amarelas! Só são bem vindas quando dentro de mim; compondo minha estrutura física de homem ridículo.

2 comentários:

  1. AS PÊRAS

    (Ferreira Gullar)

    As pêras, no prato,
    apodrecem.
    O relógio, sobre elas,
    mede
    a sua morte?

    Paremos a pêndula.De-
    teríamos, assim, a
    morte das frutas?
    Oh as pêras cansaram-se
    de suas formas e de
    sua doçura! As pêras,
    concluídas, gastam-se no
    fulgor de estarem prontas
    para nada.
    O relógio
    não mede. Trabalha
    no vazio: sua voz desliza
    fora dos corpos.

    Tudo é o cansaço
    de si. As pêras se consomem
    no seu doirado
    sossego. As flores, no canteiro
    diário, ardem,
    ardem, em vermelhos e azuis. Tudo
    desliza e está só.
    O dia
    comum, dia de todos, é a
    distância entre as coisas.
    Mas o dia do gato, o felino
    e sem palavras
    dia do gato que passa entre os móveis
    é passar. Não entre os móveis. Pas-
    sar como eu
    passo: entre nada.

    O dia das pêras
    é o seu apodrecimento.

    É tranquilo o dia
    das pêras? Elas
    não gritam, como
    o galo.

    Gritar
    para quê? se o canto
    é apenas um arco
    efêmero fora do
    coração?

    Era preciso que
    o canto não cessasse
    nunca. Não pelo
    canto (canto que os
    homens ouvem) mas
    porque can-
    tando o galo
    é sem morte.

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